OutroMundo Entrevista: Rodrigo Brandão (Mamelo Sound System)
Outromundo: Rodrigo, como você começou a fazer música?
Rodrigo Brandão: Sempre pirei na idéia da redação rítmica, de escrever uma história ou idéia e transformar aquilo em música... mas por outro lado, eu sempre fui auto-crítico, exigente comigo mesmo, nunca gostei de sair fazendo uma parada ou me dizendo alguma coisa antes de ter vivência, profundidade e conhecimento vasto do assunto, então por vários anos eu ouvi rap, acompanhei a evolução da coisa, e paralelamente fui pesquisando os outros ritmos de música negra que ajudaram o rap a ser o que é, seja o jazz, blues, soul, funky music, reggae, afrobeat, etc. Na virada do milênio, 1999 para 2000, já tinha algumas letras acumuladas e um mínimo de conhecimento, suficiente pra me considerar um iniciante assumido na arte de versar. Tive o apoio e as lições dos meus parceiros da época, como Black Alien, Speed, Max B.O. e Napoli - além da Lurdez Da Luz, minha alma-gêmea em rima.
Outromundo: Desde o início da sua carreira na música, você sempre fez parte de grupos, ou em algum momento você foi artista solo?
Rodrigo Brandão: Desde o começo, é muito mais fácil pra mim trabalhar em grupo do que ser solo, acho que no grupo a tendência é diluir o ego e extrair o melhor de cada integrante, desde que todos integrantes tenham uma boa média de talento, foco, sintonia, etc. Por isso sempre fiz parte de grupos.
Outromundo: O primeiro lançamento oficial de algo que você esteve envolvido, foi o primeiro álbum do Mamelo Sound System, em 2000?
Rodrigo Brandão: Sim, oficial mesmo foi o primeiro, mas antes disso teve um compacto em vinil de uma banda que participei nos anos 90, chamada Los Sea Dux, mas aquilo era voltado pra zuêra, ferramenta pra comer mais mina.
Outromundo: Como, você descreve esse primeiro trabalho do Mamelo?
Rodrigo Brandão: Como um caderno de esboços, um sketchbook sonoro do que a gente iria realmente fazer nos anos seguintes.
Outromundo: Em 2003, o segundo trabalho do Mamelo, o Urbália, veio com uma nova formação e uma nova roupagem sonora. Como foram essas mudanças?
Rodrigo Brandão: Foi uma coisa meio natural até, assumiu a linha de frente quem estava mais na febre de fazer a parada acontecer. Os demais tomaram outros rumos, outros caminhos. Nesse período a Lurdez já tinha chegado, o Basa ainda tava na parada e comandou a orquestra nesse disco. Hoje eu não sinto que aquilo tenha tanto a ver com o que virou depois, quando ficou só na mão da Da Luz e eu. Mas é claro que tenho respeito e carinho, foi um passo importante pra nossa caminhada ter o rumo de hoje, foi necessário pra sermos o que somos hoje, musicalmente falando.
Outromundo: O que foi, e no que foi importante, o Operação: Parcel ou Remixália pra caminhada de vocês?
Rodrigo Brandão: Foi um respiro necessário pra gente continuar fazendo show, enquanto ganhávamos tempo pra redefinir os rumos musicais do grupo depois da saída do Basa. Um álbum com alguns amigos e parceiros talentosos levando nossas acapellas pra outras paisagens sonoras. Esse play tem remixes do Munhoz (que depois entrou pro grupo), do Lumbriga (Subsolo), Lucio Maia (Nação Zumbi e Maquinado), Parteum, Hurtmold, Speed, entre outros.
Outromundo: Depois dessa entressafra, como foi a entrada do Munhoz (A.K.A. Professor M. Stereo) e o DJ PG (Elo Da Corrente e Maquinado) pro grupo?
Rodrigo Brandão: Foi espontânea e quase em sequência. Quando o Basa saiu, quem segurou os shows conosco foi o Yellow-P, meu mano até hoje. Mas ele é um DJ de reggae, faz os efeitos que a gente gosta, mas o formato é outro, e chegou uma hora que o projeto principal dele, o Dubversão Sistema de Som, começou a rolar e ficou difícil conciliar ambas as missões. Aí, um dia trombei o Munhoz e ele se ofereceu pra assumir esse posto de comandar os samplers e fazer os efeitos ao vivo. Daí, o terceiro ou quarto show com ele, teve o Lumbriga & Gato Congelado junto, e o PG era o DJ. A empatia foi natural, e quando viu ele já tava no grupo.
Outromundo: Além das performances ao vivo, o Munhoz e o PG também participam das gravações, das sessões de estúdio, ensaios, etc?
Rodrigo Brandão: Sim, ensaio sempre e gravação direto, mas não necessariamente o tempo todo - cada caso é um caso.
Outromundo: Velha Guarda 22. Como você define esse trabalho em relação aos outros discos do Mamelo?
Rodrigo Brandão: Esse é o primeiro disco que realmente conta pra Lurdez e eu. Ali a coisa tomou forma, é por aí que a gente busca seguir. Vejo nossa história como pré e pós-Velha Guarda 22.
Outromundo: Qual é a ciência do nome e da capa do Velha Guarda 22?
Rodrigo Brandão: Significa que a nossa música vai ser a Old School do futuro, do século 22! Primitivo do futuro! Foi pintada pelo Nunca, a partir de uma sessão de café com fé e fumaça na tarde do bairro, quando passei pra ele qual era o espírito do disco, a intenção carregada no título.
Outromundo: Como é o processo de produção, das batidas, quem assina as produções, vem primeiro a letra depois as bases, como é?
Rodrigo Brandão: Mesma coisa, vários são os caminhos da inspiração e da piração, né? Tem vez que a letra chama a base, e em outras é o contrário. Quem assina as produções é quem assume o papel de maestro, mas o nosso conceito, nosso estilo e ponto de vista sempre são parte de qualquer processo. Nossa personalidade é forte demais pra simplesmente se encaixar na visão de um terceiro. A troca é importante, isso sim, aí surgem as verdadeiras parcerias.
Outromundo: Como é o processo de escrita seu a da Lurdez Da Luz, vocês se juntam pra escrever, chegam num tema juntos, um começa mostra pro outro, e aí flui, como é?
Rodrigo Brandão: Tudo isso acontece, em geral, a gente prefere se encontrar e fazer junto, mas tem vez que a vida dificulta, porque ambos temos filhos pequenos. E tem vez que a inspiração chega, e aí você pode estar pelado, na rua, junto, separado, dormindo, que tem que aproveitar! Quando os anjos falam aos ouvidos do homem, só o vacilão não pára tudo pra prestar atenção!
Outromundo: Vai ter um pedacinho do Mamelo, participação sua, no solo em que a Lurdez está preparando?
Rodrigo Brandão: Sim! Eu rimo em duas faixas, o PG produz duas e faz scratch. Manda avisar o Zé Povinho que não foi dessa vez que as uruca pegaram... a família tá unida, assim que é!
Outromundo: Três anos depois do disco, como foi a resposta do público?
Rodrigo Brandão: Muuuuuuuito maior do que podíamos imaginar. Até hoje recebemos convites pra shows e gravações por conta desse trabalho. Mesmo sem lançar nada nosso nesse período, a carreira do grupo nunca teve tão agitada como agora.
Outromundo: Como foi o contato, a abordagem mesmo, no Scott, pra ele produzir o Velha Guarda 22 inteiro ali?
Rodrigo Brandão: Nos conhecemos quando a Nação Zumbi trouxe ele aqui pra mixar o álbum que eles lançaram em 2002. Desde então, o Scott voltou ao país algumas vezes, e sempre nos encontramos, a amizade foi crescendo, até o ponto de ficar evidente que ele era o cara certo pra trabalhar com o Mamelo no novo registro. Desde a metade de 2005 ficamos nos falando direto, aí em Janeiro de 2006 ele chegou aqui, ficamos internados no estúdio por quase dois meses, e o resultado é o Velha Guarda 22.
Outromundo: Rodrigo, você é um apreciador da cultura do vinil?
Rodrigo Brandão: Eu sou viciado em vinil, é o melhor formato pra se ouvir música na minha opinião. Sou colecionador, mas meu acervo não é tão grande. Devo ter uns 2000 discos, mas são escolhidos a dedo, então tem mais qualidade do que quantidade.
Outromundo: Como foi pra você, um grande apreciador de vinis, fazer o vinil da Boomshot?
Rodrigo Brandão: Foi realização de um sonho, faz tempo que tínhamos essa vontade de ouvir som nosso em vinil, e nossos amigos do Elo Da Corrente também, então juntou a fome com a vontade comer!
Outromundo: Num próximo trabalho do Mamelo, vocês pretendem lançar vinil, mesmo que seja um single?
Rodrigo Brandão: Na real, eu nem faço idéia de quando, ou como, vai sair um próximo álbum cheio do Mamelo Sound System, mas se depender da minha vontade, sai uma tiragem limitada em vinil, só pra quem é da parada de verdade, e digital mesmo, deixar pra download com a arte.
Outromundo: Quais são seus projetos agora, e mais pra frente, o que vem por aí, já estão cogitando alguma coisa nova do Mamelo?
Rodrigo Brandão: O disco solo da Lurdez é o próximo lançamento programado, mas temos mais um monte de atividades rolando. Só em 2009, já fizemos shows com Rob Mazurek, M.Takara 3, Wax Poetics, entre outros. Além das participações que temos feito nos shows do 3NaMassa (Lurdez), Contra-Fluxo (eu), Elo Da Corrente (nós dois). Em estúdio, esse ano já gravamos parcerias com Kiko Dinucci (sambista genial), Anelis Assunção (filha do Itamar), Yoka (produtor brasileiro radicado em Barcelona), Metastaz (beatmaker francês), versão da banda pós-punk Mercenárias (que tinha a mãe do Munhoz no vocal) pra trilha dum filme, e agora estamos devendo uma faixa pra MixTape da Sallve (CWB), outra pro Vol. 2 da Pau-De-Da-Em-Doido, que o Nato tá preparando, um tributo à banda gaúcha Defalla, e também vamos participar do disco solo do Ogi. Ou seja: a coisa tá fluindo bem.
Outromundo: Rodrigo, quais são as suas influências musicais?
Rodrigo Brandão: Beastie Boys, De La Soul, A Tribe Called Quest, Public Enemy, DOOM, Fela Kuti, Baden Powell, Tony Allen, Parliament/Funkadelic, War, Sly & The Family Stone, Pedro Santos, Martinho Da Vila, Lee Scratch Perry, Bob Marley, Betty Davis, John Coltrane, Wu-Tang Clan, Antipop Consortium, Cartola, Otis Redding, Sam Cooke, Paulinho Da Vila, Tim Maia, Jorge Ben, Roots Manuva, King Tubby, Stevie Wonder, Ray Barreto, Miles Davis, Aesop Rock, The Roots, The Stooges, Jimi Hendrix, Wilson Das Neves, Big Youth, Linton Kwesi Johnson, Nina Simone, Billie Holliday, Art Ensemble Of Chicago, Maceo Parker, Afrika Bambaataa, Quarteto Novo, Flora Purim, Meirelles & Os Copa 5, Hermeto Paschoal, Jurassic 5, Black Star, e por aí vai. Poderia ficar nessa por dias seguidos e ainda ficaria faltando muita coisa!
Outromundo: O que você tem escutado ultimamente de coisa recém lançada, e está gostando, de repente, poderia deixar de indicação aí?
Rodrigo Brandão: O novo do DOOM - Born Like This é animal! Também gostei muito do novo, The Ecstatic, do Mos Def. E uma banda chamada El Michels Affair, que regravou os beats clássicos do Wu-Tang com instrumentos tocados ao vivo, e ficou muito bom. O disco chama 37th Chamber, e vale da uma ouvida. Brazuca tenho ouvido o Duo Moviola, que saiu há pouco.
Outromundo: Como você vê a internet no meio do rap, ela ajuda com divulgação, mas atrapalha com downloads gratuitos de coisas que estão nas lojas e nas ruas, você acha que mais ajuda ou mais atrapalha?
Rodrigo Brandão: Boa pergunta... mas no fim me parece ter mais prós do que contras, por hora, ao menos.
Outromundo: Como você vê, na cena brasileira, hoje em dia, se viver da música, especificamente do rap?
Rodrigo Brandão: Sempre foi quase impossível, e hoje continua sendo. Os motivos mudaram, a dificuldade continua... mas eu disse 'QUASE' impossível! Se quiser maiores detalhes, pergunta pra Lurdez Da Luz.
Outromundo: Agora é o seu momento, deixe aí, agradecimentos, recados, cobranças, links, agenda, etc. Alguma coisa que não perguntamos, e gostaria de falar sobre, esse é o seu momento.
Rodrigo Brandão: Salve Neto, obrigado pelo espaço e pela troca de energia! Pra rapa que curte o trampo do Mamelo Sound System também... fiquem ligados que em breve o álbum da Lurdez tá na rua, e tem o pessoal do Hurtmold na fita, a Stefanie (PDD/Simples), Mike Ladd, Jorge Du Peixe (Nação Zumbi), PG, DJ Mako, Rump, eu. Vocês não perdem por esperar!
Sempre estamos divulgando as ações nos seguintes meios:
Myspace Oficial
Site Oficial
Muito asé a todos os homens e mulheres de boa vontade. PAZ!
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3 comentários:
Muito boa entrevista e muito nobre o espaço cedido.
valeu mesmo!
Valeu Macário.
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